Feliz Natal e Próspero Ano Novo...
quinta-feira, 22 de dezembro de 2011
segunda-feira, 12 de dezembro de 2011
Leitura de hoje
Como um rio
Ser capaz, como um rio
que leva sozinho
a canoa que se cansa,
de servir de caminho
para a esperança.
E de lavar do límpido
a mágoa da mancha,
como o rio que leva,
e lava.
Crescer para entregar
na distância calada
um poder de canção,
como o rio decifra
o segredo do chão.
Se tempo é de descer,
reter o dom da força
sem deixar de seguir.
E até mesmo sumir
para, subterrâneo,
aprender a voltar
e cumprir, no seu curso,
o ofício de amar.
Como um rio, aceitar
essas súbitas ondas
feitas de água impuras
que afloram a escondida
verdade nas funduras.
Como um rio, que nasce
de outros, saber seguir
junto com outros sendo
e noutros se prolongando
e construir o encontro
com as águas grandes
do oceano sem fim.
Mudar em movimento,
mas sem deixar de ser
o mesmo ser que muda.
Como um rio.
Thiago de Mello
domingo, 11 de dezembro de 2011
Divisão do Estado do Pará
Com 94% dos votos apurados, tudo indica que a maioria dos eleitores não concorda com a divisão do Pará em mais dois Estados.
Foi realizado um plebiscito para verificar a opinião da população quanto a este assunto. Seriam criados mais dois Estados, Tapajós (cobrindo o oeste do atual Pará) e Carajás (cobrindo o sul e o sudeste).
No plebiscito, os eleitores opinaram “sim” ou “não” quanto à criação desses estados. Caso a criação ocorresse, o Pará passaria a ter somente 17% do território atual e 64% da população total.
Com mais de 94% das seções apuradas, o comparecimento até o momento foi de 74,42%, o que corresponde a cerca de 3,4 milhões de eleitores, de um total de 4,8 milhões que compõe o eleitorado.
O voto foi obrigatório a todos os alfabetizados com idades entre 18 e 70 anos e facultativo para os analfabetos, para quem tem entre 16 e 18 anos e para aqueles que têm mais de 70 anos.
Os resultados da apuração podem ser acompanhados em tempo real pelo site do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Veja como ficaria a divisão:
sábado, 10 de dezembro de 2011
Gabarito do último Simulado de Língua Portuguesa 2011
Olá professor Rodrigo Sanches, aqui vai o gabarito das questões que o "senhor" pediu. Obrigada pela visita e pela solicitação. Continue visitando/"prestigiando" meu blog.
5ª Série D
1 C 2 B 3 D 4 A
6ª Série B
1 A 2 B 3 D 4 C
6ª Série C
1 D 2 C 3 B 4 A
7ª Série A
1 B 2 D 3 C 4 A
7ª Série B
1 A 2 D 3 B 4 C
8ª Série A
1 A 2 B 3 C 4 D
8ª Série B
1 C 2 A 3 D 4 B
8ª Série C
1 A 2 A 3 B 4 B
Resultado final do JEFECC
Depois de cinco dias de competições (05 a 09/12), envolvendo alunos professores, equipe técnica e demais funcionários da escola, chega ao final o II JEFECC – Jogos Estudantis, Feira Cultural e Cientifica da Escola Martinho Motta. Essa competição/JEFECC foi promovida pela Escola Martinho Motta da Silveira, através de sua equipe técnica envolvendo quase 600 estudantes no total, divididos entre as cores: Vermelho, Verde, Azul e Amarelo.
A semana foi agitada, animada, competitiva e bem produtiva, pois tivemos:
Segunda-feira (05/12): Feira Científica – Tema: Meio Ambiente e suas Degradações.
Terça-feira (06/12): Feira Cultural – dança, cantos, coreografias, teatro, exposição de atividades diversificadas, dramatizações, etc.
Quarta-feira (07/12): Gincana Ecológica – Competição de: lixeiras, poesias, grito de guerra, garoto e garota JEFECC, danças, torta na cara, soletrando, pergunta e resposta, etc.
Quinta-feira (08/12): Jogos Esportivos – futsal masculino e handebol feminino.
Sexta-feira (09/12): Premiação dos vencedores: 1º, 2º, 3º e 4º colocado.
O grande destaque da semana ficou centrado na “Gincana”, quarta-feira (07/12), e nos “Jogos”, quinta-feira (08/12).
O jogo feminino – handebol teve como vencedora a Equipe Azul e a segunda colocação ficou para a Equipe Amarela.
Já o jogo masculino – futsal teve como vencedor a Equipe Vermelha e o segundo lugar ficou, novamente, para a Equipe Amarela.
O resultado geral apontou como:
® 4ª colocação – Equipe Verde;
® 3ª colocação – Equipe Azul;
® 2ª colocação – Equipe Vermelha;
® 1ª colocação – Equipe Amarela.
quinta-feira, 8 de dezembro de 2011
Agora é com Monteiro Lobato
Para você que estar acompanhado nossas leituras continue lendo, pois aqui vai mais um excelente texto para você curtir.
Negrinha
Negrinha era uma pobre órfã de sete anos. Preta? Não; fusca, mulatinha escura, de cabelos ruços e olhos assustados.
Nascera na senzala, de mãe escrava, e seus primeiros anos vivera-os pelos cantos escuros da cozinha, sobre velha esteira e trapos imundos. Sempre escondida, que a patroa não gostava de crianças.
Excelente senhora, a patroa. Gorda, rica, dona do mundo, amimada dos padres, com lugar certo na Igreja e camarote de luxo reservado no céu. Entaladas as banhas no trono (uma cadeira de balanço na sala de jantar), ali bordava, recebia as amigas e o vigário, dando audiências, discutindo o tempo. Uma virtuosa senhora em suma – “dama de grandes virtudes apostólicas, esteio da religião e da moral”, dizia o reverendo.
Ótima, a dona Inácia.
Mas não admitia choro de criança. Ai! Punha-lhe os nervos em carne viva. Viúva sem filhos, não a calejara o choro da carne de sua carne, e por isso não suportava o choro da carne alheia. Assim, mal vagia, longe, na cozinha, a triste criança, gritava logo nervosa:
– Quem é a peste que está chorando aí?
Quem havia de ser? A pia de lavar pratos? O pilão? O forno? A mãe da criminosa abafava a boquinha da filha e afastava-se com ela para os fundos do quintal, torcendo-lhe em caminho beliscões de desespero.
– Cale a boca, diabo!
No entanto, aquele choro nunca vinha sem razão. Fome quase sempre, ou frio, desses que entanguem pés e mãos e fazem-nos doer…
Assim cresceu Negrinha – magra, atrofiada, com os olhos eternamente assustados. Órfã aos quatro anos, por aí ficou feito gato sem dono, levada a pontapés. Não compreendia a idéia dos grandes. Batiam-lhe sempre, por ação ou omissão. A mesma coisa, o mesmo ato, a mesma palavra provocava ora risadas, ora castigos. Aprendeu a andar, mas quase não andava. Com pretextos de que às soltas reinaria no quintal, estragando as plantas, a boa senhora punha-a na sala, ao pé de si, num desvão da porta.
– Sentadinha aí, e bico, hein?
Negrinha imobilizava-se no canto, horas e horas.
– Braços cruzados, já, diabo!
Cruzava os bracinhos a tremer, sempre com o susto nos olhos. E o tempo corria. E o relógio batia uma, duas, três, quatro, cinco horas – um cuco tão engraçadinho! Era seu divertimento vê-lo abrir a janela e cantar as horas com a bocarra vermelha, arrufando as asas. Sorria-se então por dentro, feliz um instante.
Puseram-na depois a fazer crochê, e as horas se lhe iam a espichar trancinhas sem fim.
Que idéia faria de si essa criança que nunca ouvira uma palavra de carinho? Pestinha, diabo, coruja, barata descascada, bruxa, pata-choca, pinto gorado, mosca-morta, sujeira, bisca, trapo, cachorrinha, coisa-ruim, lixo – não tinha conta o número de apelidos com que a mimoseavam. Tempo houve em que foi a bubônica. A epidemia andava na berra, como a grande novidade, e Negrinha viu-se logo apelidada assim – por sinal que achou linda a palavra. Perceberam-no e suprimiram-na da lista. Estava escrito que não teria um gostinho só na vida – nem esse de personalizar a peste…
O corpo de Negrinha era tatuado de sinais, cicatrizes, vergões. Batiam nele os da casa todos os dias, houvesse ou não houvesse motivo. Sua pobre carne exercia para os cascudos, cocres e beliscões a mesma atração que o ímã exerce para o aço. Mãos em cujos nós de dedos comichasse um cocre, era mão que se descarregaria dos fluidos em sua cabeça. De passagem. Coisa de rir e ver a careta…
A excelente dona Inácia era mestra na arte de judiar de crianças. Vinha da escravidão, fora senhora de escravos – e daquelas ferozes, amigas de ouvir cantar o bolo e estalar o bacalhau. Nunca se afizera ao regime novo – essa indecência de negro igual a branco e qualquer coisinha: a polícia! “Qualquer coisinha”: uma mucama assada ao forno porque se engraçou dela o senhor; uma novena de relho porque disse: “Como é ruim, a sinhá!”…
O 13 de maio tirou-lhe das mãos o azorrague, mas não lhe tirou da alma a gana. Conservava Negrinha em casa como remédio para os frenesis. Inocente derivativo:
– Ai! Como alivia a gente uma boa roda de cocres bem fincados!…
Tinha de contentar-se com isso, judiaria miúda, os níqueis da crueldade. Cocres: mão fechada com raiva e nós de dedos que cantam no coco do paciente. Puxões de orelha: o torcido, de despegar a concha (bom! bom! bom! gostoso de dar) e o a duas mãos, o sacudido. A gama inteira dos beliscões: do miudinho, com a ponta da unha, à torcida do umbigo, equivalente ao puxão de orelha. A esfregadela: roda de tapas, cascudos, pontapés e safanões a uma – divertidíssimo! A vara de marmelo, flexível, cortante: para “doer fino” nada melhor!
Era pouco, mas antes isso do que nada. Lá de quando em quando vinha um castigo maior para desobstruir o fígado e matar as saudades do bom tempo. Foi assim com aquela história do ovo quente.
Não sabem! Ora! Uma criada nova furtara do prato de Negrinha – coisa de rir – um pedacinho de carne que ela vinha guardando para o fim. A criança não sofreou a revolta – atirou-lhe um dos nomes com que a mimoseavam todos os dias.
– “Peste?” Espere aí! Você vai ver quem é peste – e foi contar o caso à patroa.
Dona Inácia estava azeda, necessitadíssima de derivativos. Sua cara iluminou-se.
– Eu curo ela! – disse, e desentalando do trono as banhas foi para a cozinha, qual perua choca, a rufar as saias.
– Traga um ovo.
Veio o ovo. Dona Inácia mesmo pô-lo na água a ferver; e de mãos à cinta, gozando-se na prelibação da tortura, ficou de pé uns minutos, à espera. Seus olhos contentes envolviam a mísera criança que, encolhidinha a um canto, aguardava trêmula alguma coisa de nunca visto. Quando o ovo chegou a ponto, a boa senhora chamou:
– Venha cá!
Negrinha aproximou-se.
– Abra a boca!
Negrinha abriu a boca, como o cuco, e fechou os olhos. A patroa, então, com uma colher, tirou da água “pulando” o ovo e zás! Na boca da pequena. E antes que o urro de dor saísse, suas mãos amordaçaram-na até que o ovo arrefecesse. Negrinha urrou surdamente, pelo nariz. Esperneou. Mas só. Nem os vizinhos chegaram a perceber aquilo. Depois:
– Diga nomes feios aos mais velhos outra vez, ouviu, peste?
E a virtuosa dama voltou contente da vida para o trono, a fim de receber o vigário que chegava.
– Ah, monsenhor! Não se pode ser boa nesta vida… Estou criando aquela pobre órfã, filha da Cesária – mas que trabalheira me dá!
– A caridade é a mais bela das virtudes cristãs, minha senhora – murmurou o padre.
– Sim, mas cansa…
– Quem dá aos pobres empresta a Deus.
A boa senhora suspirou resignadamente.
– Inda é o que vale…
Certo dezembro vieram passar as férias com Santa Inácia duas sobrinhas suas, pequenotas, lindas meninas louras, ricas, nascidas e criadas em ninho de plumas.
Do seu canto na sala do trono, Negrinha viu-as irromperem pela casa como dois anjos do céu – alegres, pulando e rindo com a vivacidade de cachorrinhos novos. Negrinha olhou imediatamente para a senhora, certa de vê-la armada para desferir contra os anjos invasores o raio dum castigo tremendo.
Mas abriu a boca: a sinhá ria-se também… Quê? Pois não era crime brincar? Estaria tudo mudado – e findo o seu inferno – e aberto o céu? No enlevo da doce ilusão, Negrinha levantou-se e veio para a festa infantil, fascinada pela alegria dos anjos.
Mas a dura lição da desigualdade humana lhe chicoteou a alma. Beliscão no umbigo, e nos ouvidos, o som cruel de todos os dias: “Já para o seu lugar, pestinha! Não se enxerga?”.
Com lágrimas dolorosas, menos de dor física que de angústia moral – sofrimento novo que se vinha acrescer aos já conhecidos – a triste criança encorujou-se no cantinho de sempre.
– Quem é titia? – perguntou uma das meninas, curiosa.
– Quem há de ser? – disse a tia, num suspiro de vítima. – Uma caridade minha. Não me corrijo, vivo criando essas pobres de Deus… Uma órfã. Mas brinquem filhinhas, a casa é grande, brinquem por aí afora.
– Brinquem! Brincar! Como seria bom brincar! – refletiu com suas lágrimas, no canto, a dolorosa martirizinha, que até ali só brincara em imaginação com o cuco.
Chegaram as malas e logo:
– Meus brinquedos! – reclamaram as duas meninas.
Uma criada abriu-as e tirou os brinquedos.
Que maravilha! Um cavalo de pau!… Negrinha arregalava os olhos. Nunca imaginara coisa assim tão galante. Um cavalinho! E mais… Que é aquilo? Uma criancinha de cabelos amarelos… que falava “mama”… que dormia…
Era de êxtase o olhar de negrinha. Nunca vira uma boneca e nem sequer sabia o nome desse brinquedo. Mas compreendeu que era uma criança artificial.
– É feita?… – perguntou, extasiada.
E dominada pelo enlevo, num momento em que a senhora saiu da sala a providenciar sobre a arrumação das meninas. Negrinha esqueceu o beliscão, o ovo quente, tudo, e aproximou-se da criatura de louça. Olhou-a com assombrado encanto, sem jeito, sem ânimo de pegá-la.
As meninas admiraram-se daquilo.
– Nunca viu boneca?
– Boneca? – repetiu Negrinha. – Chama-se Boneca?
Riram-se as fidalgas de tanta ingenuidade.
– Como é boba! – disseram. – E você como se chama?
– Negrinha.
As meninas novamente torceram-se de riso; mas vendo que o êxtase da bobinha perdurava, disseram, apresentando-lhe a boneca:
– Pegue!
Negrinha olhou para os lados, ressabiada, com o coração aos pinotes. Que ventura, santo Deus! Seria possível? Depois pegou a boneca. E muito sem jeito, como quem pega o Senhor menino, sorria para ela e para as meninas, com assustados relanços de olhos para o porta. Fora de si, literalmente… era como se penetrara no céu e os anjos a rodeassem, e um filhinho de anjo lhe tivesse vindo adormecer ao colo. Tamanho foi o seu enlevo que não viu chegar a patroa, já de volta. Dona Inácia entreparou, feroz, e esteve uns instantes assim, apreciando a cena.
Mas era tal a alegria das hóspedes ante a surpresa extática de Negrinha, e tão grande a força irradiante da felicidade desta, que o seu duro coração afinal bambeou. E pela primeira vez na vida foi mulher. Apiedou-se.
Ao percebê-la na sala Negrinha havia tremido, passando-lhe num relance pela cabeça a imagem do ovo quente e hipóteses de castigos ainda piores. E incoercíveis lágrimas de pavor assomaram-lhe aos olhos. Falhou tudo isso, porém. O que sobreveio foi a coisa mais inesperada do mundo – estas palavras, as primeiras que ela ouviu, doces, na vida:
– Vão todas brincar no jardim, e vá você também, mas veja lá, hein?
Negrinha ergueu os olhos para a patroa, olhos ainda de susto e terror. Mas não viu mais a fera antiga. Compreendeu vagamente e sorriu.
Se alguma vez a gratidão sorriu na vida, foi naquela surrada carinha…
Varia a pele, a condição, mas a alma da criança é a mesma – na princesinha e na mendiga. E para ambos é a boneca o supremo enlevo. Dá a natureza dois momentos divinos à vida da mulher: o momento da boneca – preparatório –, e o momento dos filhos – definitivo. Depois disso, está extinta a mulher.
Negrinha, coisa humana, percebeu nesse dia da boneca que tinha uma alma. Divina eclosão! Surpresa maravilhosa do mundo que trazia em si e que desabrochava, afinal, como fulgurante flor de luz. Sentiu-se elevada à altura de ente humano. Cessara de ser coisa – e doravante ser-lhe-ia impossível viver a vida de coisa. Se não era coisa! Se sentia! Se vibrava!
Assim foi – e essa consciência a matou.
Terminadas as férias, partiram as meninas levando consigo a boneca, e a casa voltou ao ramerrão habitual. Só não voltou a si Negrinha. Sentia-se outra, inteiramente transformada.
Dona Inácia, pensativa, já a não atazanava tanto, e na cozinha uma criada nova, boa de coração, amenizava-lhe a vida.
Negrinha, não obstante, caíra numa tristeza infinita. Mal comia e perdera a expressão de susto que tinha nos olhos. Trazia-os agora nostálgicos, cismarentos.
Aquele dezembro de férias, luminosa rajada de céu trevas adentro do seu doloroso inferno, envenenara-a.
Brincara no sol, no jardim. Brincara!… Acalentara, dias seguidos, a linda boneca loura, tão boa, tão quieta, a dizer mamã, a cerrar os olhos para dormir. Vivera realizando sonhos da imaginação. Desabrochara-se de alma.
Morreu na esteirinha rota, abandonada de todos, como um gato sem dono. Jamais, entretanto, ninguém morreu com maior beleza. O delírio rodeou-a de bonecas, todas louras, de olhos azuis. E de anjos… E bonecas e anjos remoinhavam-lhe em torno, numa farândola do céu. Sentia-se agarrada por aquelas mãozinhas de louça – abraçada, rodopiada.
Veio a tontura; uma névoa envolveu tudo. E tudo regirou em seguida, confusamente, num disco. Ressoaram vozes apagadas, longe, e pela última vez o cuco lhe apareceu de boca aberta.
Mas, imóvel, sem rufar as asas.
Foi-se apagando. O vermelho da goela desmaiou…
E tudo se esvaiu em trevas.
Depois, vala comum. A terra papou com indiferença aquela carnezinha de terceira – uma miséria, trinta quilos mal pesados…
E de Negrinha ficaram no mundo apenas duas impressões. Uma cômica, na memória das meninas ricas.
– “Lembra-te daquela bobinha da titia, que nunca vira boneca?”
Outra de saudade, no nó dos dedos de dona Inácia.
– “ Como era boa para um cocre!…”
Monteiro Lobato
quarta-feira, 7 de dezembro de 2011
Leiam um pouco mais
A terra onde não se morre nunca
– Não me agrada muito esta história de que um dia todos devem morrer: quero procurar a terra onde não se morre nunca.
Despede-se do pai, da mãe, dos tios e primos, e parte. Anda dias, anda meses, e a todos os que encontrava perguntava se sabiam lhe ensinar o caminho do lugar onde não se morre nunca: mas ninguém sabia. Um dia encontrou um velho, com uma barba branca até o peito, que empurrava uma carriola cheia de pedras. Perguntou-lhe:
– Sabe me indicar onde é o lugar em que não se morre nunca?
– Não quer morrer? Fique comigo. Enquanto eu não tiver terminado de transportar com a minha carriola toda aquela montanha, pedra por pedra, você não há de morrer.
– E quanto tempo vai levar para desmanchá-la?
– Vou levar cem anos.
– E depois deverei morrer?
– Não há outro jeito.
– Não, este não é o lugar para mim: quero ir a um lugar onde não se morra nunca.
Cumprimenta o velho e segue em frente. Anda que anda, e chega a um bosque tão grande que parecia sem fim. Havia um velho com uma barba até o umbigo que cortava galhos com uma podadeira. O jovem lhe perguntou:
– Por favor, um lugar onde não se morra nunca, sabe me dizer onde é?
– Fique comigo – disse-lhe o velho. – Enquanto eu não tiver cortado o bosque inteiro com a minha podadeira, você não há de morrer.
– E quanto tempo vai levar?
– Hum! Duzentos anos.
– E depois deverei morrer do mesmo jeito?
– Certamente. Não lhe basta?
– Não, este não é o lugar para mim: vou em busca de um lugar onde não se morra nunca.
Despediram-se, e o jovem seguiu adiante. Depois de alguns meses, chegou à beira-mar. Havia um velho com a barba até os joelhos, que observava um pato beber água do mar.
– Por favor, conhece o lugar onde não se morre nunca?
– Se tem medo de morrer, fique comigo. Olhe: enquanto este pato não tiver enxugado o mar com seu bico, você não há de morrer.
– E quanto tempo vai levar?
– Cerca de trezentos anos.
– E depois será preciso que eu morra?
– E o que pretende? Quantos anos mais gostaria de viver?
– Não: tampouco este lugar serve para mim; tenho que ir para onde não se morre nunca.
Retomou o caminho. Uma noite chegou a um palácio magnífico. Bateu, e quem abriu foi um velho com a barba até os pés:
– O que deseja, bom jovem?
– Estou a procura do lugar onde não se morre nunca.
– Então acertou. Este é o lugar onde não se morre nunca. Enquanto ficar aqui comigo, esteja seguro de que não morrerá.
– Finalmente! Andei um bocado! Este é exatamente o lugar que procurava. Mas e o senhor? Está contente de que eu esteja aqui?
– Claro que sim, muito contente: vai me fazer companhia.
Assim o jovem se estabeleceu no palácio com aquele velho e levava vida de senhor. Passavam os anos e ninguém se apercebia: anos, anos e anos. Um dia o jovem disse ao velho:
– Puxa vida, junto com o senhor a gente se sente realmente bem, mas gostaria de ir ver como andam meus parentes.
– Mas que parentes você quer ir ver? A esta altura estão todos mortos há muito tempo.
– Bem, que quer que lhe diga? Tenho vontade de rever minha terra natal, e quem sabe não encontro os filhos dos filhos dos meus parentes.
– Se está mesmo decidido, vou lhe ensinar como deve fazer. Vá até a estrebaria, pegue meu cavalo branco, que possui a virtude de andar como o vento, mas lembre-se de não descer jamais da sela, por nenhuma razão, pois, se descer, morrerá no mesmo instante.
– Fique tranquilo, não desmonto: tenho muito medo de morrer!
Foi à estrebaria, preparou o cavalo branco, montou e lançou-se com a força do vento. Passa no lugar em que encontrara o velho com o pato: onde antes ficava o mar agora havia um grande prado. De um lado havia uma pilha de ossos do velho. “Veja só”, disse o jovem consigo mesmo, “fiz bem em seguir adiante; se tivesse ficado com esse aí a esta hora também eu estaria morto!”
Continuou seu caminho. Onde existia aquele grande bosque que um velho devia cortar com a podadeira, agora havia um descampado: não se via mais nem uma árvore. “Também junto com este aqui”, pensou o jovem, “já estaria morto há um bom tempo!”
Passou pelo lugar onde existia aquela enorme montanha que um velho devia desmanchar pedra por pedra: agora havia uma planície achatada como um bilhar.
– Com este aqui já estaria mais do que morto!
Anda que anda, e chega à terra natal, mas esta mudara tanto que não reconhecia mais. Procura sua casa, mas não existia mais nem mesmo a rua. Pergunta pelos seus, porém ninguém jamais ouvira seu sobrenome. Ficou mal. “É melhor que regresse logo”, disse para si mesmo.
Virou o cavalo e tomou o caminho de volta. Não estava nem mesmo na metade do caminho quando encontrou um carreteiro, que conduzia uma carroça cheia de sapatos velhos, puxada por um boi.
– Senhor, faça uma caridade! – disse o carreteiro. – Desça um momento e me ajude a levantar esta roda, que saiu fora da trilha.
– Tenho pressa, não posso descer da sela – disse o jovem.
– Conceda-me esta graça, veja que estou sozinho, a noite vem chegando…
O jovem se apiedou dele e desmontou. Ainda estava com um pé no estribo e outro no chão quando o carreteiro o agarrou por um braço e disse:
– Ah! Finalmente o peguei! Sabe quem sou? Sou a Morte! Está vendo todos aqueles sapatos furados ali na carroça? São todos os que me fez gastar para correr atrás de você. Agora consegui! Todos têm que acabar nas minhas mãos, não há escapatória!
E ao pobre jovem, também a ele só restou morrer.
Ítalo Calvino
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